quarta-feira, 6 de junho de 2007

A armadilha das estatísticas

Sempre gostei da matemática e nada tenho contra as estatísticas, Porém, fico eriçado quando se utilizam os números estatísticos para lançar poeira aos olhos das pessoas. Já é velho o exemplo de que quando dois amigos comem um frango de churrasco se diz que cada um comeu meio frango, o que pode ocultar a triste realidade de um ter comido todo o frango e o outro só o ter cheirado ou nem isso.

O aumento do PIB per capita não significa obrigatoriamente que todas as pessoas melhoram o seu poder de compra, pois o mais provável é que haja muitos que pioram a sua situação financeira em compensação de outros que aumentam grandemente a sua riqueza. A cada aumento do PIB per capita há, forçosamente, uma maior diferença entre os mais ricos e os mais pobres.

Moralmente, seria defensável que os aumentos beneficiassem os mais carentes para ser obtida uma mais justa e equilibrada distribuição da riqueza. Mas tal só seria conseguido por uma intervenção autoritária do Poder político, contra-natura, e que seria injusta e desincentivaria o desenvolvimento, pois este advém, normalmente, das capacidades dos mais aptos, dos mais preparados, dos mais ousados, que se sentiriam desmotivados e explorados se lhes retirassem o fruto da sua actividade meritória, com medidas tendentes à igualização da riqueza. E, pelo seu poder económico, exercem uma pressão incontornável sobre os governantes.

A recompensa do mérito não é de hoje e já a Bíblia (Mateus 25.14.30 e Lucas 19.11-27) nos relata a «parábola dos dez talentos», segundo a qual cada um deve receber o prémio da sua produtividade, o fruto da sua capacidade de gestão.

Daí que as manifestações contra a globalização, ocorridas durante a reunião do G8, sendo a expressão de uma justa preocupação dos menos favorecidos na economia mundial, poucos resultados palpáveis obterão. Mas se forem bem conduzidas com elaboração de informação credível poderão tornar as condições menos punitivas para os explorados, devendo para isso apontar sugestões que beneficiem também os mais ricos, como a protecção do ambiente e tipos de actividade que, dando lucros aos tubarões, melhorem as economias mais débeis, elevando a qualidade de vida dos habitantes dos países menos desenvolvidos. Mas nunca perder de vista que os poderosos só são sensíveis ao aumento dos seus lucros, o que conduz a que a argumentação terá de ter isso em conta e sugerir actividades que sejam aceitáveis por eles e, ao mesmo tempo, úteis aos mais pobres. Há que seguir a estratégia dos navegadores das caravelas, não enfrentando os ventos dominantes mas utilizando-os para progredir com sucesso.

4 comentários:

Manel do Montado disse...

Parabéns pelo texto que reveste uma autêntico manifesto político de seriedade.
Ora vejamos:
O capitalismo desenfreado, travestido de neo-liberalismo, apoiado por muitos partidos europeus de centro-direita, só teve sucesso porque é destes grandes potentados económicos que vêm os financiamentos partidários, os empregos garantidos para os filhos, assessores, esposas, amantes, etc.
Jamais acreditei que um político se preocupe comigo ou com quem quer que seja a não ser com os da sua igualha.
Estas políticas selvagens de aumento brutal das margens de lucro em desfavor dos salários só foram possíveis com uma casta de oportunistas medíocres que num país a sério não teriam tido sucesso.
Um abraço

A. João Soares disse...

Caro Manel,
Mas, apesar destas realidades visíveis e compreensíveis, passam despercebidas a muita gente. Há muitas pessoas convencidas que os detentores do poder pensam em nós. Pra miragem e ilusão ingénua e infantil. Basta entreabrir os olhos para vermos que é assim e que a utilização de argumentos aparentemente válidos é falaciosa.
Mas o mal está generalizado e nem a séria Inglaterra escapa, pois ate o ministro da educação proíbe os melhores alunos de levantar o braço quando o professor pergunta «Quem sabe?». Não lhes interessam as pessoas esclarecidas, preferem que sejamos todos burros... ou camelos.

Um abraço
A. João Soares

Belinha Fernandes disse...

Pois eu vi-me sempre às aranhas com as matemáticas...e talvez por isso de cada vez que me apresentam números eu leio e releio e volto a ler a ver se percebi bem, penso e repenso...E desconfio!!!Eu sei que é insegurança minha mas graças a isso vejo cada uma! Os números sobre o desemprego, por exemplo.O que é que nos dizem?É mais o que escondem do que aquilo que nos dizem!Quanto aos detentores do poder só pensarem em si, isso é mais que válido desde o topo político ministerial ao local, passando pelo empresarial e institucional.É triste mas quem alcança o poder, regra geral, não vê mais nada.Usa o poder para se manter no poder.Compra mais poder.O poder é assim uma espécie de moeda...Bom fim de semana!Parece que finalmente localizei o seu blog!

A. João Soares disse...

Cara Belinha,
O seu comentário diz tudo. Está clarinho. Para completar o seu pensamento nesta matéria dê um a«salto ao blog Do Mirante (faça clique no link aqui ao lado esquerdo e lei um comentário que deixei no post «É difícil o combate à corrupção».
As palavras são como as cerejas, como dizia a minha avó

Beijinhos
João