quarta-feira, 18 de julho de 2007

Inconvenientes da maioria absoluta

O Parlamento, em funcionamento normal, tendo como objectivo encontrar as melhores soluções para o País, em sobreposição a interesses particulares de partidos ou outros grupos, muito ganharia com a participação em consenso dos vários intervenientes, sem autoritarismos, arrogâncias ou teimosias apoiadas na maioria absoluta. Duas cabeças pensam melhor do que apenas uma, e os partidos da oposição têm capacidade para moderar posições menos sensatas e para chamar a atenção para pormenores positivos não negligenciáveis. Mas, infelizmente, a maioria manifesta-se inconveniente para o bem do País, por se considerar única detentora da verdade, alimentando egoísmo e vaidade, o que a impede de ver e ouvir a realidade e o bom caminho. Uma lei que é aprovada apenas pelo partido do Governo perde credibilidade. Seguem-se alguns exemplos retirados da imprensa recente.

A redacção final da Lei Política Criminal (LPC), correspondendo, no essencial, à proposta de lei apresentada pelo Governo, foi aprovada pela Assembleia da República na semana passada apenas com o voto favorável da maioria" socialista, o que fez ficar perplexo o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP). Este denuncia "erros jurídicos graves" e "contradições" e questiona se a LPC é uma ruptura assumida ou a governamentalização da justiça penal. Segundo o sindicato, a lei poderá colocar em causa a essência do Ministério Público, encarregado pela Constituição de defender a legalidade, agir com objectividade nos processos, e fragilizar o Procurador-Geral da República se este definir directivas que violem as normas basilares do Código Penal, pelo que a promulgação da lei poderá ser "um desafio difícil" para o PGR.

Também o Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES) é criticado por ser uma manta de retalhos e não uma verdadeira reforma do Ensino Superior", o que se deduz do facto de o PS apresentar 74 propostas de alteração. Com todos estes remendos, poderá concluir-se que a proposta do Governo estava mal preparada e elaborada de forma atabalhoada.

Também a lei das finanças locais passou com o "sim" isolado do PS e agora, como a nova lei das finanças regionais enfrenta a contestação da Assembleia Regional da Madeira, a maioria absoluta do PS irá sozinha garantir de novo ao Governo a aprovação de uma proposta de lei polémica.

Mas, os próprios socialistas começam a estar preocupados embora sem forma bem definida. Os inconvenientes da arrogância do Poder estão a fazer-se sentir, como se viu no Congresso [socialista], em que o ministro da Saúde foi deixado a falar praticamente sozinho, parecendo que a sua intervenção "foi acolhida pelos poucos presentes com grande frieza". A sua política de Saúde parece estar subordinada ao compromisso de destruir o Serviço Nacional de Saúde, e abrir espaço para os grupos privados, o que não parece agradar a alguns socialistas mais sérios.

6 comentários:

Anónimo disse...

Caro Jõao Soares
O assunto epigrafado,já por si delicada em condições normais num quadro democrático,constitui no caso nacional actual, pelas inúmeras ocorrências conhecidas,um problema deveras preocupante quando não até ameaçador para a ordem e vivência democráticas.Os comportamentos dos agentes do poder(titulares da indesejável e nefasta maioria absoluta)têm vindo a revelar evidentes sinais de deriva,de falta de isenção,de arrogância e de prepotência que aliados à fraca preparação política,à insensibilidade social,à deficiente qualidade intelectual e às mais que conhecidas fragilidades de carácter de alguns, acabam por criar um caldo nada tranquilizante e abonatório num Estado de Direito.
É muito triste mas é verdade!!!!

A. João Soares disse...

Caro Valdemar Clemente, Compreendo o alerta. Embora num regime dito democrático, os oligarcas comportam-se como ditadores. Os sintomas já são abundantes, desde o Charrua a outras demissões devido ao «bom» serviço de bufos que pretendem evidenciar a sua dedicação ao Poder para receberem as «devidas» recompensas, que podem ser lugar de assessor, deputado nas próximas eleições, etc
Abraço

augustoM disse...

Uma maioria é como uma ditadura, o diálogo perde-se na vontade omnipotente que quem a detém. A solução não passa por governos sem maioria, os acordos acabam por encontrá-la e tudo se torna igual.
Todos querem a Democracia, mas ninguém quer controlá-la. Democracia da forma que existe, é a maneira legal de eleger a ditadura.
Um abraço. Augusto

A. João Soares disse...

Caro Augustom,
As suas palavras definem perfeitamente uma realidade que é indiscutível. Na verdade, o poder para não cair em exageros e destemperos, tem que ser controlado, para o que tem de haver mecanismos eficientes e credíveis.
Os fundadores dos Estados Unidos da América tiveram essa preocupação, de criar sistemas de controlo e moderação dos poderes do Presidente.
Sugiro a leitura do livro «SISTER REVOLUTIONS - French Lightning,American Light» de Susan Dunn, Edit Faber and Faber, Inc.
è um estudo cuidadoso que relaciona as revoluções Francesa e a Americana, tendo esta aproveitado a experiência da primeira e limado muitas arestas evitando cair nos mesmos erros. Foram elas que criaram o muno moderno. O poder quando não é eficazmente controlado, tende para o abuso e este não tem limites.
A oposição devia controlar o poder, mas os interesses são comuns - hoje beneficias tu, amanhã beneficio eu - e há vícios permanentes e comuna a uns e outros, como é o caso da corrupção. Nem o Poder nem a oposição, num país sem ética como o nosso, está nteressado na luta contra ela.
Abraço

Savonarola disse...

Concordo inteiramente consigo quando alerta para os perigos da maioria absoluta. Estes tempos do socratismo recordam-me os de triste memória do cavaquismo...
Um abraço

A. João Soares disse...

Caro Saonarola,
A maioria absoluta, embora dê oportunidade à entrada da ditadura, mesmo que temporária (até ao fim do mandato), podia ter vantagem nos actos governativas, no caso de os governantes serem sensatos e honestos, colocando os interesses nacionais acima dos do partido e seus amigos, mas isso só seria possível no Paraíso. Mas errar é humano e, quanto ao erro, os políticos são demasiado humanos!
Abraço