sábado, 28 de julho de 2007

Sexo, natalidade e poder dominante

Sexo em democracia
João Miranda, Investigador em biotecnologia, jmirandadn@gmail.com

Existe um consenso em Portugal de que o Estado deve promover a natalidade. Ninguém pergunta porque é que um assunto tão íntimo como a decisão de cada um se reproduzir é uma questão nacional, digna de atenção e de debate político. A resposta está na relação entre a natureza humana e a política.

Os seres humanos são, por natureza, obcecados pelo sexo. Mas não se trata de uma obsessão fortuita. É uma consequência da selecção natural. Aqueles que não eram obcecados pelo sexo não se chegaram a reproduzir e nós herdámos a obsessão pelo sexo daqueles que se reproduziram. A obsessão pelo sexo está relacionada com a obsessão pelo poder. O poder é apenas um meio para conseguir sexo, mas não o sexo pelo sexo, mas o sexo que gera descendência. Quem tem poder político tende a seguir estratégias de maximização da descendência. Os imperadores da China tinham milhares de concubinas numa corte servida por eunucos, os chefes de clã tinham o mítico direito de pernada e, em todas as épocas e em todas as culturas, os homens mais velhos mandam os mais novos (a concorrência) morrer na guerra. É natural que o homem democrático tenha também as suas estratégias para maximizar o seu sucesso reprodutivo.

Numa democracia o poder não pertence ao tirano, mas à maioria. O poder não se exerce directamente pela força, mas indirectamente por transferência de recursos através do sistema fiscal e dos subsídios do Estado. Estas peculiaridades da democracia originam dois tipos de fenómenos correlacionados. Por um lado o eleitorado é muito intolerante para os líderes que utilizem a sua posição para maximizar as suas oportunidades sexuais (caso de Bill Clinton). Por outro, os políticos consideram, muito acertadamente, que para serem reeleitos devem contribuir, ou pelo menos aparentar contribuir, para a maximização do número de descendentes da maioria dos seus eleitores.

Se bem que se conheçam alguns casos de Estados democráticos que recorreram, tal como os antigos imperadores chineses, à castração física das minorias (deficientes e párias sociais, no caso da Suécia entre 1934 e 1974), tais métodos são, compreensivelmente, impopulares. Em democracia, a maioria recorre à castração económica da minoria. Mas dado que as maiorias são instáveis, cada partido terá que captar segmentos do eleitorado para formar a sua maioria. Os subsídios à natalidade servem para captar uma fatia do eleitorado oferecendo em troca garantias económicas de que esse segmento terá mais hipóteses de se reproduzir com sucesso. O actual Governo optou por distribuir a maior parte dos incentivos à natalidade pela população de classe mais baixa, provavelmente por acreditar que este é o segmento mais fácil de captar. Mas o Governo deve ter cuidado. Os membros da classe média sentiram-se castrados.

NOTA: Não é demonstrado, nem sequer referido, por ser uma incoerência inexplicável, o apoio, quase incentivo, ao aborto livre por simples vontade da grávida. Se, por um lado se distribuem incentivos à natalidade, o que está em concordância com a história, as teorias sociológicas e as estatísticas demográficas, como se compreende que, por outro lado, se esteja como que a «convidar» as mulheres a abortar, à custa do Estado, sem taxas moderadoras nem lista de espera, sem terem de apresentar razões lógicas?

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