segunda-feira, 3 de novembro de 2008

O Estado é 'pessoa de bem'?

Em tempos não muito distantes, era ensinado na educação cívica que o Estado no seu sentido lato, englobando as autarquias, e os agentes de autoridade, deve ser considerado pelos cidadãos como ‘pessoa de bem'. Quando aqui se fala de Estado refere-se a estrutura política e administrativa, pois o Estado é o conjunto de três factores: População, território e a estrutura política, sendo esta destinada a defender a integridade do território e a garantir o bem-estar da população.

Porém, nas relações entre as populações e o Estado, nem sempre esse preceito cívico é levado a sério e ouvem-se lamentos frequentes de falta de seriedade do Estado, o que coloca em dúvida de ainda ser considerado, pelos cidadãos, ‘pessoa de bem’. Há até quem compare os seus mais altos representantes com aquilo que existe de pior e é mais indesejável na sociedade.

Como dizia Almeida Garrett, «A voz do povo é voz de Deus» e será bom olhar á volta à procura de sinais que possam anular ou confirmar as motivações desses lamentos. Serão reais ou apenas maledicência?

Sabe-se que o Estado deve muitos milhões a empresas às quais não paga no prazo adequado os fornecimento de serviços e de materiais mas, pelo contrário, exige que elas paguem os impostos que lhes são fixados nos prazos por ele estabelecidos, sem perdão de qualquer atraso. Parece, realmente, não ser atitude de ‘pessoa de bem’.

Também com os militares algo se apresenta confuso. Deles se exigem restrições aos direitos consagrados pela Constituição e sacrifícios inerentes ao risco das missões a que são destinados Para tal foi estabelecido o conceito de ‘condição militar’ que dava cobertura a compensações correspondentes a tais riscos e sacrifícios. Porém, recentemente, os governos retiraram essas compensações a que chamaram ‘regalias’ e, no entanto, continuam a exigir a obediência às mesmas restrições aos direitos fundamentais, considerando os militares como vulgares funcionários públicos, o que demonstra intenção perversa pois não há nenhum funcionário das Finanças, da Segurança Social, ou de outro ministério, que esteja sujeito a tais restrições, riscos e obrigação de disponibilidade. Para mais, como os militares não têm sindicato nem direito a greve ou manifestação, os seus salários estão hoje reduzidos a metade dos de outros servidores do Estado que há 10 anos recebiam por igual. Parece, realmente, não ser atitude de ‘pessoa de bem’.

Olhando à volta para descortinar da razoabilidade dos comentários e lamentos que se ouvem nos lugares públicos, outros casos se encontram, mas por agora, ficamos por estes, que são bastante significativos.

6 comentários:

Anónimo disse...

Nada mais a propósito!
A “entrevista” do MDN à RTP1, ontem, deixou-me perplexo, à mistura com um sentimento de pesar por ver entregue nas mãos do entrevistado a “responsabilidade política” - que ele próprio relevou - relativamente às Forças Armadas.
A minha perplexidade resulta da manifesta incoerência de algumas “ideias” (se o são) e de conceitos (se existem). Ora vejam:
A dado passo “garantiu” “...estar a trabalhar para responder às exigências que têm vindo a ser apresentadas pelos militares”. Se o MDN, do alto das suas competências políticas, está a trabalhar para responder às exigências, reconhece a licitude e a pertinência das mesmas; de outra forma porque dar-se ao ao trabalho?
Por isso fiquei perplexo!
Noutro passo afirma que «...há um conjunto de preocupações, de expectativas, de anseios em várias áreas da sociedade portuguesa e também existem nas Forças Armadas”. Muito bem, o MDN reconhece publicamente que as Forças Armadas evidenciam preocupações e têm expectativas e anseios. Já não há forma, portanto, de as escamotear! E garante logo a seguir que “O Governo através do ministério da defesa e os quatro chefes militares, estão a trabalhar para resolver as preocupações que existem”.(Bravíssimo, senhor ministro, expressou publicamente que existem preocupações! Nunca fôra tão longe!
Só que, referindo-se às palavras do Tenente-General Loureiro dos Santos e delas o “alegado mal-estar que se vive nas forças armadas”, o MDN mostra ser incoerente e estar confuso! Então reconhece - e fá-lo publicamente - preocupações, expectativas, anseios e exigências - e nega a existência de mal-estar nas Forças Armadas? Mas os Homens e Mulheres que fazem as forças armadas não têm sentimentos? Não são maridos e pais? E ainda que só nesta condição, não têm direito a sentir mal-estar? E sentindo-o, não o podem expressar, ainda que pela voz de um dos seus Generais mais prestigiados?
Por isso fiquei perplexo!
Mas algo de positivo retive das declarações que aqui comentei, e é a declaração clara de que o MDN e os quatro chefes militares estão a trabalhar para resolver as preocupações!
Pondo de lado a ideia que me ficou de que os cinco são lentos a resolvê-las, é tempo, então, de os chefes, através das competências que lhes são próprias, fazer o mais elementar do cargo de chefia: informar e esclarecer, sempre, a toda a hora, através de todos os escalões. Contribuirão assim para a manutenção de um estado de espírito, expectante, sim, mas confiante.
E, de outro lado, valorizar a sua competência técnica, junto do poder político, para provar, sistemática e teimosamente, que qualquer força armada, se garante do estado democrático, como creio, não pode viver e actuar em situações de mal estar, alimentadas por promessas que não são cumpridas; por expectativas que se deixaram criar e, agora, se ignoram; por anseios que, embora legítimos, querem confrontar com princípios de equidade.
Disse o MDN em certo passo da entrevista que as forças armadas têm especificidades que as fazem diferentes de outros agentes do estado. Claro! Só que o que tem sido feito é exactamente no sentido de nivelar, tornando igual o que é diferente. E isso, porque à sombra do princípio da igualdade, é má fé.
Artur Pinto

Anónimo disse...

A esta pergunta terei que responder de imediato que NÃO! E porquê? Porque para que lado me vire o estado tudo faz para merecer este NÃO! É com a Saúde, é com a Educação, é com os Militares, é com a Justiça, é com a política, é com as Reformas milionãrias aos políticos e não só, etc., etc. É um nunca acabar de situações que nos levam a pensar deste modo e o que ele faz? Cada vez a fazer pior, não tem mesmo emenda, continua no "faz de conta" como se nada acontecesse..... É tudo uma "SEM VERGONHA"!!!!!

A. João Soares disse...

Caro Artur Pinto,
Ele reconhece publicamente que há nos militares EXIGÊNCIAS, provenientes de PREOCUPAÇÕES, EXPECTATIVAS e ANSEIOS.
O que significa que a sua acção durante o tempo em que ocupa o cargo foi de molde a que essa situação se agravasse, por incapacidade ou por vontade. Se fosse por incapacidade já devia ter-se demitido. Se é por vontade, os militares deviam tê-lo impedido de continuar, por qualquer meio.
Quanto aos generais ouvi hoje que o General Amaro Romão, quando comandante da AM, disse que um general só merece sê-lo se todos os dias arriscar as estrelas, dizendo para cima o que pensa e opondo-se a decisões com que não concorde.
Um chefe deve defender sistematicamente e teimosamente os seus subordinados, principalmente quando se trata de trabalhadores privados de sindicato, de greve, de manifestação na rua. Os chefes militares devem desempenhar a função de líder sindical.E isso que fazem??? Não!!! Defendem as estrelas que usam no uniforme e a do Mercedes.
Obrigado por comentário tão bem elaborado, à medida das tuas capacidades.
Abraço
João

A. João Soares disse...

Caro Luís,
Citei dois aspectos mais em foco nas últimas notícias, mas, como dizes, há muito mais casos gritantes, como SAÚDE, EDUCAÇÃO, JUSTIÇA, luta contra a CORRUPÇÃO, Reformas milionárias, distribuição de tachos não pela competência, mas por compadrio, etc. etc.
Há que dar motivo ao povo para ter confiança nos governantes, para deixarem de ser anti-políticos, como Cavaco já referiu e como já tinha dito Jorge Sampaio. Só que, para isso, deve haver forte reconversão dos políticos.
Abraço
João

Anónimo disse...

«informar e esclarecer, sempre, a toda a hora, através de todos os escalões»
Caro Artur Pinto
As chefias, os chefes, esqueceram há muito o preceito a cima.
Há tempos no Exército, um CEM talvez influenciado por Júlio César, implementou a "informação descendente", destinada a levar periodicamente informação do comando ás unidades (Barrento).
Não só o teor das Msg perdeu rapidamente qualidade, como jamais se lembraram de criar um tipo de "informação ascendente"
Outro (Viegas), discursou em Santa Margarida, dizendo querer desenvolver uma cultura de responsabilidade entre os quadros e gerir por excepção para ter tempo para pensar. Viu-se.
Quanto ao MD que temos, é altura de falar claro: uma legislatura perdida. Comecei hoje, no DN.
Cumprimentos
BMonteiro

A. João Soares disse...

Caro B Monteiro,
O uso e abuso da autoridade é uma tentação muito forte dos que detêm poder. Se tivessem intenção de comandar(mandar com) conjugando as vontades dos subordinados não deixariam de estabelecer um circuito ascendente de informação, para auscultarem as preocupações, expectativas e anseios do pessoal. Caro BMonteiro, em 1970 o CEM do Comando Territorial do Açores, usando o relatório mensal de acção psicológica, escreveu o mal-estar dos militares, e teve como resposta de Lisboa que o comando devia serenar os espíritos dos militares e não usar a sua posição para fazer subversão. Este espírito de comando, pelos vistos, não melhorou com o 25 de Abril!!!
Em Roma, os escravos revoltaram-se: a revolta de Spartacus!
Um abraço
João