segunda-feira, 21 de novembro de 2011

O Quarto Reich. A guerra pode ter já recomeçado

A inflamada declaração de Angela Merkel, numa entrevista à televisão pública alemã, ARD, em que sugere a perda de soberania para os países incumpridores das metas orçamentais, bem como a revelação sobre o papel da célebre família alemã Quandt, durante o Terceiro Reich, ligam-se, como peças de puzzle, a uma cadeia de coincidências inquietantes.

Gunther Quandt foi, nos anos 40, o patriarca de uma família que ainda hoje controla a BMW e gere uma fortuna de 20 mil milhões de euros. Compaghon de route de Hitler, filiado no partido Nazi, relacionado com Joseph Goebbels, Quandt beneficiou, como quase todos os barões da pesada indústria alemã, de mão-de-obra escrava, recrutada entre judeus, polacos, checos, húngaros,russos, mas também franceses e belgas. Depois da guerra, um seu filho, Herbert, também envolvido com Hitler, salvou a BMW da insolvência,tornando-se, no final dos anos 50, uma das grandes figuras do milagre económico alemão.

Esta investigação, que iliba a BMW mas não o antigo chefe do clã Quandt, pode ser a abertura de uma verdadeira caixa de Pandora. Afinal, o poderio da indústria alemã assentaria directamente num sistema bélico baseado na escravatura, na pilhagem e no massacre. E os seus beneficiários nunca teriam sido punidos, nem os seus empórios desmantelados.

As discussões do pós-Guerra incluíam, para alguns estrategas, a desindustrialização pura e simples da Alemanha - algo que o Plano Marshal,as necessidades da Guerra Fria e os fundadores da Comunidade Económica Europeia evitaram. Assim, o poderio teutónico manteve-se como motor da Europa. Gunther e Herbert Quandt foram protagonistas deste desfecho.

Esta história invoca um romance recente de um jornalista e escritor de origem britânica, a viver na Hungria, intitulado "O protocolo Budapeste". No livro, Adam Lebor «ficciona» sobre um suposto directório alemão, que teria como missão restabelecer o domínio da Alemanha, não pela força das armas, mas da economia. Um dos passos fulcrais seria o da criação de uma moeda única que obrigasse os países a submeterem-se a uma ditadura orçamental imposta desde Berlim. O outro, descapitalizar os Estados periféricos,provocar o seu endividamento, atacando-os, depois, pela asfixia dos juros da dívida, de forma a passar a controlar, por preços de saldo, empresas estatais estratégicas, através de privatizações forçadas. Para isso, o directório faria eleger governos dóceis em toda a Europa, munindo-se de políticos-fantoche em cargos decisivos em Bruxelas - presidência da Comissão e, finalmente, presidência da União Europeia.

Adam Lebor não é português - nem a narração da sua trama se desenvolve cá. Mas os pontos de contacto com a realidade, tão eloquentemente avivada pelas declarações de Merkel, são irresistíveis. Aliás, "não é muito inteligente imaginar que numa casa tão apinhada como a Europa, uma comunidade de povos seja capaz de manter diferentes sistemas legais e diferentes conceitos legais durante muito tempo." Quem disse isto foi Adolf Hitler. A pax germânica seria o destino de "um continente em paz, livre das suas barreiras e obstáculos, onde a história e a geografia se encontram,finalmente, reconciliadas" - palavras de Giscard d'Estaing, redactor do projecto de Constituição europeia.

É um facto que a Europa aparenta estar em paz. Mas a guerra pode ter já recomeçado.

Texto de Filipe Luís extraído da revista Visão

Imagem do Google

3 comentários:

Zé Povinho disse...

Trilham-se caminhos demasiado perigosos e com uma leveza que impressiona pela inconsciência dos mandantes.
Abraço do Zé

A. João Soares disse...

Caro Zé Povinho,

Refere dois aspectos que devem ser devidamente ponderados: os caminhos perigosos e a leviandade e inconsciência de quem se propõe segui-los.

A humanidade está num momento de viragem, na perspectiva de entrada num novo Renascimento em que os valores essenciais sejam recuperados e outros novos se desenvolvam.

O desenvolvimento das tecnologias que recentemente se tornou mais rápido exige que a sua utilização seja devidamente estudada com sentido de responsabilidade e de humanidade, para que dele resulte benefício para as pessoas, nomeadamente para o respeito mútuo e para um relacionamento positivo, construtivo. Tecnologia com uso menos humanizado pode gerar graves inconvenientes.

Nesta mudança de época ou era ou idade, os vícios esclerosados das gerações anteriores devem ser combativos naquilo que tenham de negativo e freador da liberdade responsável. Para isso são precisas decisões com algum risco, seguir caminhos menos trilhados, mas é preciso que não sejam «demasiado perigosos», desnecessariamente perigosos. O risco, em qualquer actividade deve ser devidamente calculado. É indispensável que os donos do Poder não sejam levianos e inconscientes e se habituem a pensar antes de decidir, por forma a que o risco seja ultrapassado pelos benefícios adquiridos.

Mas infelizmente assistimos, com demasiada frequência, a leviandade, inconsciência, falta de sensatez, de sentido de Estado, de sentido de responsabilidade e da noção de que devem agir sempre em benefício dos eleitores que representam. Qualquer hesitação que seja tornada decisão sem prévio estudo e ponderação, acaba por dar recuos, que além de outros prejuízos causam perda de tempo.

Por outro lado, as equipas devem saber trabalhar em conjunto com estratégias bem coordenadas para objectivos bem definidos e compreendidos por cada elemento da equipa para nunca haver visível falta de coerência, de convergência de esforços. Se os primeiros-ministros, chefes das equipas governativas, têm dúvidas, devem consultar os Mourinhos dos seus países para dirigirem colóquios de esclarecimento aos governantes sobre o que é trabalhar em equipa.

Abraço
João

A. João Soares disse...

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